quarta-feira, 21 de dezembro de 2022

As invasões francesas e a freguesia de Vila Fernando- 2ª parte

Graça Sousa- professora

2ª parte

Constam ainda desse “Mapa geral” algumas observações sobre acontecimentos dramáticos que nos deixam entrever a profunda violência a que foram sujeitos os nossos antepassados e que, nitidamente, se assemelham às imagens de guerras atuais que a televisão nos mostra diariamente. Essas observações ficam aqui transcritas.

“Além das pessoas de que se faz menção neste mapa, muitas outras têm morrido depois, por causa de pancadas, tiros e feridas com que foram maltratadas pelos franceses, fadigas, moléstias e privações de toda a espécie e continuam a morrer. Ignora-se mesmo a sorte de algumas, que foram obrigadas a ir com o inimigo.

Todas as do sexo feminino, ou a maior parte, que tiveram a infelicidade de lhes cair nas mãos, foram atroz e brutalmente insultadas, sem respeito da idade, ou condição, nem a moléstias; e muitas mortas por modos os mais bárbaros e estranhos, sem lhes valer terem fugido para as serras e sítios mais inacessíveis.

Os Templos foram horrorosamente profanados com ultrajes do Mistério mais Augusto da Religião, onde não pôde acautelar-se, com irrisão e destruição das Imagens quase todas, demolidos os Altares; queimados todos os móveis e mesmo o pavimento e forro; e muitos destelhados. Abriram muitas sepulturas pela suspeita de que ocultariam dinheiro ou outras preciosidades e de alguns fizeram lupanar.

Quase nada escapou pelos campos e serras por mais escondido que estivesse porque as gentes apanhadas eram afogadas com cordas e padeciam outros tratos, os mais desumanos, para que declarassem onde paravam as coisas escondidas. Depois eram mortas a tiro ou a ferro ou as deixavam enforcadas em árvores.

As terras pela maior parte ficaram incultas por falta de gados, de braços e de sementes. A maior parte dos habitantes vivem unicamente das ervas do campo.

Em muitas das relações não se faz especial menção do número de cabeças de gado roubado, ou das quantidades de géneros, dinheiro ou outras coisas, mas é certíssimo que em todas as freguesias invadidas se fizeram os mesmos roubos e desacatos de que há no mapa declaração.

Finalmente, todas as freguesias invadidas ficaram reduzidas à maior miséria que pode imaginar-se. É este o testemunho unânime de todos párocos.

Os Templos, e as casas, que não foram inteiramente queimadas ou demolidas, ficaram somente com as paredes e telhados, sem portas, sem janelas, nem trastes de qualidade alguma, com muito poucas excepções.

Não há exemplo de devastação tão bárbara e de mãos dadas com a mais decidida impiedade.”

(Nota: algumas palavras foram atualizadas.)

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