sexta-feira, 14 de fevereiro de 2025

realidade(s). o perceber (d)o mundo

(Publicado originariamente na edição do Jornal A Guarda do dia 30 de Janeiro)

A realidade o que é? A realidade é? A realidade, o mundo poderão ser uma construção da nossa consciência, como que um assombro subjectivo: tal como as cores que estão em nós e não nos objectos? Que diálogo se estabelece (e cada um estabelece) entre a visão ávida de surpresa e a consciência eternamente insatisfeita e em alerta pela percepção? Que barreira, que cortina inultrapassável separa cada ser humano das percepções que os outros indivíduos obtêm dos mesmos objectos, das mesmas coisas, do mesmo mundo (da mesma realidade?)?
E poderíamos continuar com outras perguntas tais que originariam respostas mais (se as houver!). Talvez como certo, só uma ténue certeza de que a realidade se estrutura de múltiplas realidades, portanto de novos e surpreendentes e inusitados pormenores que vamos encontrando à medida que estamos expostos à Coisa-mundo…
((Abrindo aqui um grande parênteses – e quase como um despropósito que adveio agora alardeadamente ao pensamento e não se desassoma - particularizando e reflectindo na realidade política, poderíamos quase classifica-la como: a realidade do (real) fingimento. Da política nacional à política local assentam muito no fazer de conta. Muitos dos políticos fingem que se interessam pelos cidadãos e fingem tão completamente que se convencem (e convencem tantos) que o seu interesse é substantivo e substancial; colocando-se num estado em que a ficção e o real se entremeiam de tal forma que se tornam quase indissociáveis- actores em potência, ou de facto, ou!..
Os cidadãos, nas suas profusas (infelizmente não muito profundas) análises à polis já não fingem tanto e censuram sem piedade as muitas ficções e enredos que se lhes apresentam; de forma geral, pois quando em contacto directo com os eleitos ou candidatos, os sorrisos e os cumprimentos desdobram-se em reverências… Muitos dos políticos acham, de algum modo, o comum dos eleitores inferiores, uma maçada necessária! Estes acham aqueles hipócritas, no mínimo. Portanto, estão todos em estreita comunhão… na dissimulação.
E a realidade (alocada à verdade!) vai-se desconstruindo numa miríade de percepções de percepções. de impressões. de sensações. Normalmente negativas e catastrofistas.
Ainda assim, neste contínuo exercício de fingimento nem todos se envolvem ou deixam envolver e é por isso, se calhar, que ainda não vivemos num quase simulacro da realidade e da realidade de si, enquanto sociedade e enquanto indivíduos; ou vivemos?!.))
Fechando agora o grande parênteses, talvez a realidade ou as realidades nos advenham da experiência do que se passou, do que aconteceu “lá fora”, no mundo, e evocada “cá dentro”, na consciência, se estabeleça uma troca, uma interacção permanente entre a consciência do Eu e o pensar o Mundo… Será que é o Ver que dá origem ao Perceber (entendido como o trazer, o passar do “lá fora” para a consciência) que possibilita o Pensar?
Talvez o reflectir- que analisa demoradamente e em silêncio as coisas a partir de um eixo, de um centro interior primordial- seja profundamente subjectivo, e nessa subjectividade, qualquer reflexão, seja improvável transmiti-la ao outro; como se os olhos e os “olhos” do pensamento formem em si mesmos uma certeza última, sólida, diferente e, tantas vezes, oponente da do outro; e impossível de deslocar para fora de si essa “verdade” vivida e (re)confirmada no mais íntimo do ser: uma visão pessoal, individual da presença no mundo e da evidência do mundo que traz, e faz, prova (ontológica) do Ser. da Existência. da Realidade como tal… não se podendo transferi-la para um outro. Talvez.
O eu (entretecido) no mundo que se exprime e consubstancia a partir do Eu-mundo?
(e a Guarda- e Vila Mendo- e a realidade de si?)
Indagações. somente. isso.

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