(Publicado originariamente na edição do Jornal A Guarda do dia 26 de Outubro.)
Com certeza que a Guarda não é excepção; com certeza Portugal e todo o mundo democrático padecem duma espécie de degenerescência-informativa (e formativa) na sua essência. Se os media tradicionais e mormente as redes sociais nos permitem conhecer mais, conhecer melhor, alertar, opinar (ou pelo menos comentar) e portanto proporcionar toda uma participação activa em benefício da(s) comunidade(s); não é menos verdade que, paradoxalmente, afasta, isola e conduz a conflitos permanentes- ora inconsequentes, ora pungentes.
Tendo por base as redes sociais abertas (e suas caixas de comentários) dos jornais, rádios, blogues e etc., bem como a “opinião” de comentadores é visível um clima de crispação, de azedume, de queixinhas, de confronto, de má educação… O respeito, pedra basilar de qualquer relação- da individual à comunitária- é constantemente… desrespeitado: não há filtros, não há mediação (coisa que, pelo menos, os media tradicionais deviam fazer) e assim tudo é dito, tudo é partilhado, tudo é comentado, tudo é analisado (sem análise consistente ou coerente, tantas vezes)… mas desse tudo pouco é reflectido. Todos têm “opinião” sobre tudo e sobre todos, mas poucos se apercebem do quase nada que transmitem- a não ser um narcisismo ilimitado.
E achamos que a liberdade é (só) isto! Quando pensamos que tudo podemos dizer e tudo nos é permitido dizer e da forma que queiramos estamos a enfermar a Democracia. Estamos a cavar fossos, trincheiras, a alimentar extremismos que irão, paulatina e assertivamente, aniquilar o nosso mundo livre. É o que fazemos aos poucos com a verborreia nas redes sociais (insociais), com a saga (quase que praga) de tudo comentar e de tudo dar a conhecer sem conhecermos verdadeiramente aquilo sobre o que nos manifestamos.
Se aos anónimos tendemos a não valorá-los (até porque nem eles se valoram), aos comentadores dos diversos órgãos de comunicação pede-se que sejam isentos (não-fácil, é certo); pede-se que não caiam nos vieses cognitivos que inquinam até a análise mais lúcida; pede-se que utilizem um tom respeituoso, mesmo quando discordando em absolutidade: pensar diferente não significa conflito imanente- esses conflitos que atafulham o espaço mediático e imediato com uma enormidade de questiúnculas insanáveis pelos fartos orgulhos.
Na Guarda, pede-se aos comentadores também e isso mesmo: que não se deixem levar pela crítica desmesurada e porque sim, pelo dizer mal para a obtenção de alguma vantagem daqueles que se apoia. Pede-se que conheçam as matérias de que falam e tenham uma visão de conjunto que não esteja espartilhada em múltiplas situações isoladas. Pede-se que mantenham a contenção verbal na discordância e mesmo na concordância. Pede-se que ajudem a colocar os assuntos em contexto, que aportem soluções possíveis (pinceladas por idealismos impossíveis). Pede-se que que caminhem na esperança (real) sabendo que a adversidade espreita a cada passo. Pede-se que abracem ilusões pragmáticas num mundo de desilusões programáticas. Pede-se que se reflictam e assim nos ajudem a reflectir melhor a nós.
Pede-se tanto, que de tanto pouco importa. Sobra o resto. Que é muito!
Aos comentadores-faladores de ocasião (anónimos ou não) pede-se comedimento reflexivo e aproximativo (a vida não é a preto e branco; não tem de ser o Nós contra Vós). Aos media locais pede-se a simplicidade-complexa da informação e mediação. A todos nós, pede-se tolerância permanente e… tolerância exigente.
No fundo, e como que um desejo secreto ou aberto, como que uma “teleologia”, o que todos os comentadores quereriam era ser fazedores-de-opinião. Mas isso… está ao alcance de uns poucos eleitos (não-eleitos)!
A opinião deve andar de braço dado com o Bem-comum.
Simples. Complexo. Agora. Sempre.
2 comentários:
Mais uma reflexão atual e muito bem conseguida.
Parabéns, Filipe
Um abraço
Zé Domingos
Obrigado.
Forte abraço.
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