domingo, 26 de outubro de 2014

Ida à lenha

 Uma equipa de respeito! Faltam os cozinheiros...


sexta-feira, 24 de outubro de 2014

Figuras da Terra- por Manuel Silva

O admirável contador de estórias- parte III
Nas noites de verão, as varandas e os quinze degraus de acesso das duas casas transformavam-se num improvisado anfiteatro invertido, pejado de crianças e adultos. O nosso contador de estórias, de pé, com os antebraços apoiados na resguarda que separa as duas varandas, divisória constituída por um monobloco granítico, dominava as atenções e quando expressamente solicitado ou por sua iniciativa dizia, qual pancada de Molière - “É cmó oto”1. A expressão mágica tinha um efeito arrasador, todos nós nos transformávamos em espetadores atentos e silenciosos para ouvir a estória que, inevitavelmente, se seguia.
No final de cada estória comentava-se a mesma e salientavam-se as lições de moral. Tratava-se, portanto, de um verdadeiro “momento do conto” onde o narrador assumia convicta e pedagogicamente a arte da comunicação.
Eis algumas das estórias que o compadre contava mais frequentemente, sem a reprodução fiel da forma como eram narradas mas, depois das expressões acima referidas, o leitor pode imaginar quão maravilhoso e interessante era ouvi-lo.

1.     A mentira grande como o Credo
Uma viúva vivia numa quinta de renda com os seus três filhos: um padre, um doutor e um pastor.
Um dia foi falar com o senhorio e disse-lhe que não tinha dinheiro para pagar a renda.
O senhorio fez-lhe a seguinte proposta:
- Se um dos teus filhos me trouxer uma mentira tão grande como o Credo, eu perdoo-te a renda.
A pobre viúva chegou a casa e relatou aos filhos a proposta que o proprietário da quinta lhe fez. Quer o padre, quer o doutor, não mostraram ser capazes de engendrar tão grande mentira mas o filho pastor aceitou o desafio.
- Fica descansada, mãe, que eu vou falar como senhorio!
No dia seguinte o filho pastor dirigiu-se à casa do senhorio que também era seu padrinho. Ao chegar junto do senhorio disse-lhe:
- Toquei o sino com um badalo de lã e ouvia-se por 10Km de terra chã. Depois fui ao rio colhi agrões (agriões?), vendi agrões e até ao padrinho lhe vendi um cabaz.
Mas isso é uma grande mentira – respondeu o senhorio.
- Então, meu padrinho, minha mentira aprovada, renda da quinta perdoada.

2.      O pintassilgo e o cuco
No tempo em que os animais falavam, um pintassilgo estava a cantar às portas do céu e Nossa Senhora gostou tanto do seu canto que deu instruções ao S. Pedro para que lhe desse tudo de bom para o passarinho comer.
O pintassilgo saiu do céu, todo contente, a cantar e encontrou um cuco.
O cuco perguntou-lhe o porquê daquela alegria toda e o pintassilgo relatou-lhe então a forma com foi tratado no céu.
O cuco foi, também, pôr-se a cantar às portas do céu …
Quando regressou, vinha a chorar e encontrou-se com o pintassilgo, este perguntou-lhe o que tinha acontecido.
O pobre do cuco respondeu-lhe que tinha levado com uma moca e que não lhe tinham dado comida.
Então o pintassilgo perguntou-lhe como tinha cantado.
- Eu cantei cu-cu - respondeu o cuco.
- Ai cantaste com o cu, então cantasses com o bico – disse-lhe o pintassilgo.

3.      O Zé Miséria (ou “De galhoto em galhoto”, como nós pedíamos)
O Zé Miséria foi para o Brasil e deixou cá os pais, um irmão e uma irmã.
No Brasil não lhe correu a vida bem e regressou. Quando chegou a casa dos pais encontrou o irmão a cozer feijões e a comê-los.
- Que estás fazendo, pá?
- Comendo os de cima e esperando os debaixo.
- Então e a nossa irmã?
- Está chorando o riso do ano passado.
- Então e os nossos pais?
- O pai viu um mealheiro no cimo de um castanheiro, subiu lá e caiu de galhoto em galhoto, chegou ao chão e espatifou-se.
- E a nossa mãe?
- A nossa mãe com tudo isto foi-se… Fizemos-lhe um funeral tão lindo que a saia tinha trinta cores.
- Ui! Isso foi uma riqueza!

Compreensão da estória:
O irmão estava a comer os feijões crus à espera que viessem os do fundo já cozidos.
Quanto à irmã, ela namorava um rapaz e ele arranjou-lhe um filho e agora passa miséria porque tem que trabalhar para se governar a ela e ao filho.
O pai com a queda que deu do castanheiro morreu.
Relativamente ao funeral da mãe, a saia tinha trinta cores que correspondiam aos trinta remendos.

O diálogo entre os irmãos continuava:
- Ah, mas ainda existe o mealheiro. Tinha muito dinheiro – perguntava o brasileiro.
- Olha, eram dois ouriços com castanhas podres.
Concluiu o brasileiro, o Zé Miséria:
- Puta que pariu Portugal, se no Brasil há miséria…aqui há muita mais.

N.B.
1. Ao terminar este “folhetim” sobre uma das figuras vilamendenses que recordo com mais saudade e que tentei reportar o mais fidedigna possível a forma singular como o contador de estórias transmitia o seu enorme manancial de saberes.
Quis, também, homenagear e deixar publicamente o meu apreço por este homem que, apesar das dificuldades em se expressar, era capaz de maravilhar crianças, jovens e adultos com as suas estórias.
Um verdadeiro autodidata, este admirável contador de estórias. 
Obrigado, “compadre” José Bragança!
2. Agradeço a todos aqueles que contribuíram para o meu avivar de memória, particularmente à minha mãe.

                                                    Manuel da Silva Gonçalves
41- É como o outro

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Ida à lenha/almoço/reunião

Domingo, pelas 9h30, iremos à lenha. Quem quiser ajudar... Faremos também um almoço decorrente da Festa do Chichorro/Matança do Porco. Durante a tarde, uma reunião dos órgãos directivos. Um Domingo dedicado à Associação e a Vila Mendo como tal.

quarta-feira, 22 de outubro de 2014

domingo, 19 de outubro de 2014

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

Figuras da Terra- por Manuel Silva

 Zé Bragança- O admirável contador de estórias- parte II
O “meu” compadre tinha um problema de dicção e quando falava trocava o r intervocálico ou mesmo sendo dobrado pelo d, e quando o r é precedido ou seguido de uma consoante pura e simplesmente era omitido; com o s/ç a pronúncia assemelhava-se ao anglo-saxão th. Esta particularidade aliada a uma capacidade de descrição e de interação das diferentes personagens da mesma estória ou até de estórias diferentes davam-lhe uma graciosidade nas suas narrativas que, reconhecidamente, faziam dele um admirável contador de estórias.
Para mais fácil compreensão de algumas palavras e expressões que utilizava, aconselha-se a leitura da legenda em rodapé.
Alguns exemplos mais conhecidos:
Ex.1 - “O cavalho1 da badoca2 deita quato3 futos4 pude5 ano: bugalha(th)s6, bugalhinho(th)s7, bolota(th)s8 e maç(th)ã(th)s9 cuca(th)s10.
 Ex.2  Numa situação em que a burra teimava em não sair da loja, gritava ele:
- Buda1112 foda! 13 Buda pá foda!
 Ex.3 Noutra ocasião a pobre da burra caiu numa vala num terreno designado de barroca e então ele solicitava à esposa que gritasse por socorro:
- Guita14, Istminda15, guita! A budanca16 caiu na dibanceida17 da badoca18!
A esposa não o compreendeu e perguntou-lhe se era a tamanca. Ele retorquiu já irritado:
- Não cadalho19, foi a budanca que caiu na dibanceida da badoca! Guita! Guita!
 Ex.4 Num jantar de casamento em que os comensais não ficaram saciados alguém, ironicamente, fez uma rima (rima que se generalizou para todas as situações em que a refeição fosse demasiado frugal). Eis o diálogo entre dois convivas:
- Estou que nem poss(th)o20 - afirmava um. E o outro retorquia:
- Dêmo(th)s21 gaças22 e louvode(th)s23
As no(th)as24 badigas25 e(th)stão26 que nem un(th)s27 tambode(th)s.28
Se  mai(th)s29 não comemo(th)s30
Foi poque31 mai(th)s não no(th)s32 dedam33 noss(th)os34 amo(th)s35
O(th)xalá36 um dia ele(th)s37 fiquem como nó(th)s38 agoda 39 es(th)tamo(th)s 40
 Os pátios da casa dos “compadres” e da casa dos meus avós confundiam-se porque não havia nenhum muro a separá-los e, coisa rara na aldeia, no que concerne à habitação dos meus familiares não havia qualquer muro a separá-lo da rua principal que atravessa a povoação. Esta circunstância retirava a privacidade aos proprietários e, naturalmente, convidava o acesso direto a todos aqueles que quisessem juntar-se numa agradável cavaqueira, especialmente nas noites estivais.
                   
                     Manuel Silva Gonçalves                     Continua...
      
1-carvalho;  2-barroca; 3-quatro; 4-frutos; 5- por; 6-bugalhas; 7-bugalhinhos; 8-bolotas; 9-maçãs; 10-cucas; 11-burra; 12-para; 13-fora; 14-grita; 15-Estamarinda; 16- burranca; 17-ribanceira; 18-barroca; 19-caralho; 20-posso; 21-dêmos; 22- graças; 23-louvores; 24-nossas; 25-barrigas; 26-estão; 27-uns; 28-tambores; 29-mais; 30-comemos; 31-porque; 32-nos; 33-deram; 34-nossos; 35-amos; 36-oxalá; 37-eles ; 38-nós; 39-agora; 40-estamos

                                                                                                          

sábado, 11 de outubro de 2014

Coisas da Vida- Zé Valentim

Faleceu mais uma pessoa de Vila Mendo: o Sr. José Soares Ferreira, mais conhecido por Zé Valentim. Contava com 80 anos e nos últimos meses a sua saúde degradou-se bastante. Dono de uma energia inesgotável, superava muitos jovens em capacidade de trabalho e muitos mais (ou todos) em espírito de sacrifício. Amigo da juventude, tinha um gosto especial pela Associação, que frequentava assiduamente e ajudava com especial alegria e carinho: " nunca deixeis acabar a Associação" dizia ele repetidas vezes. No próximo fim-de-semana iremos à lenha e também aí sentiremos a sua falta: todos os anos era dos primeiros a chegar e era vê-lo trabalhar como poucos... com um sorriso grande e... maior "genica"! Mais uma grande perda para a nossa aldeia... enfim... paulatinamente as nossas comunidades vão, inexoravelmente, ficando mais pobres e, com elas, cada um de nós perde um pouco de si mesmo...
À família (na qual também me incluo por ser meu tio) os nosso sinceros pêsames. O funeral é amanhã, Domingo, às 11h. 

quinta-feira, 9 de outubro de 2014

Momentos- Vila Mendo On Tour

 Prova de Vinhos- Colinas de São Lourenço- Anadia

terça-feira, 7 de outubro de 2014

Vila Mendo On Tour

 A partida
 Prova de vinhos-Colinas de São Lourenço- Anadia
Serra do Bussaco
 Coimbra
 Castelo da Lousã e Ermida de Nossa Senhora da Piedade
 Cooperativa de mel- Lousamel
Aldeia do Xisto- Candal

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

Figuras da Terra- por Manuel Silva

Zé Bragança- O admirável contador de estórias-  Parte I 
O pai prolongou o serviço militar durante nove anos, devido aos sucessivos castigos a que foi sujeito. Foi enviado para a India e de lá regressou sem fortuna, com uma imagem do Sagrado Coração de Jesus, com a saúde debilitada e aos trinta e poucos anos faleceu deixando o humilde agregado familiar composto pela viúva, duas filhas e um menino que face à situação de pobreza da família, cedo se tornou homem. Como diria Soeiro Pereira Gomes, o nosso personagem trata-se, pois, de um “Homem que nunca foi Menino”.
Gastou a vida a trabalhar para outrem, para sustentar a família. Aos doze anos carregava às costas sacas de batatas de cinco e seis arrobas dos armazéns do “ Chico” Lucas para a gare da estação de Vila Fernando. A enxada foi a ferramenta inseparável do nascer ao pôr do sol, no cultivo das vinhas e hortas das famílias abastadas de Vila Fernando e também nos terrenos que possuía nas regadinhas, na horta da peça, na balsa,... Mais tarde, tornou-se num dos principais obreiros da construção dos muros que suportam os socalcos dessa obra ”faraónica”, a quinta do dr. Crespo. 
Os cinco filhos rumaram para França, onde mais tarde se radicaram com as respetivas famílias, com a exceção do Horácio que por lá faleceu, prematuramente, num acidente de trabalho. A velhice passou-a com a sua inseparável companheira, a sua Istminda. Ambos eram analfabetos e quando recebiam correspondência a comadre aparecia na casa dos meus pais, de lágrima nos olhos, para saber as notícias dos ”nossos”, vocábulo que utilizava em relação aos filhos.
Tive o privilégio de com ele conviver quando as marcas da árdua e longa vida já se faziam notar porque vivia paredes meias com a casa dos meus avós. As matanças eram partilhadas, assim como os longos serões de inverno passados muitas vezes a jogar o jogo da sueca de que ele tanto gostava. E quando a coisa não corria a contento lá saía a expressão “O vi-delas ganhou ao (th)sabias.”
Os meus pais apadrinharam o casamento do filho mais novo, o José, e, por isso, tratavam-se por compadres; eu e os meus irmãos adotámos, carinhosamente, esse mesmo tratamento “compadres”. 
O compadre era homem de baixa estatura como a maioria dos seus contemporâneos e, por força do trabalho braçal, tinha os membros superiores bem desenvolvidos parecendo dar razão à teoria da evolução das espécies de Charles Darwin. A este propósito vem-me à memória a expressão do ti António Dias: – Que mãos tão grandes para um corpo tão pequeno! Os membros inferiores, já trôpego, arrastavam-se dentro das botas invariavelmente desapertadas. Dizem que, quando novo, era extremamente veloz e ganhava uma corrida a qualquer um, mesmo com uma saca às costas e os tamancos desapertados.

                          Manuel Silva Gonçalves                                     Continua...