quarta-feira, 15 de janeiro de 2025

balanço(s)?

(Publicado originariamente na edição do Jornal A Guarda do dia 02 de Janeiro)

Nestas alturas do ano é (ou parece ser) habitual, quase que obrigatório, um certo tipo de balanço, um apuramento do que de bom ou nem tanto se passou individual e colectivamente e em diversos domínios (que não se vão abordar aqui). Uma súmula daquilo que foi (ou pensamos que foi) e do que queremos (queremos?) para o amanhã.
Mas estas análises, primeiramente individuais (quando as há) sujeitas às pressões dos momentos e das modas, raramente se arquitectam em profundidade e tornam-se somente (ainda que seja alguma coisa) um conjunto de propósitos a cumprir; sem se cumprirem porque quase nunca reflexionados no e a partir do Silêncio-estrutura…
Como se aquele que foi e que fez aquilo tenha deixado de o ser, e passe a ser um-outro nos desígnios a que agora se propõe (e quase nunca impõe). Como se o eu-do-passado desse lugar a um eu-do-futuro (melhor, com certeza!). E o eu-do-presente fica… impresente, indistinto, invisível, desamparado pelo ontem esquecido, enca(n)deado pelo porvir milagroso.
Um balanço balanceado de trás para a frente; da frente para trás; e de novo de trás para a frente; e de novo… e nunca Aqui. parado. e nunca aqui reflectido verdadeiramente. Um balanço que pressuporia mudança efectiva e afectiva na realidade e na realidade de si, mas que não tem carácter e marca de duração; portanto um balanço de hesitação, de oscilação que não quis (ou pelo menos não pôde, não soube), que quer e não sabe se pode, se sabe; ou se quer mesmo.
Se os balanços pessoais são atreitos aos balanceamentos enleados e conjunturais, os colectivos são-no por (quase) natureza ainda mais. Perspectivamos as comunidades, a sociedade, o país pelos olhos de quem balança e balança, e nunca pára para olhar tudo (o possível) e assim apreendermos o todo (ou um pouquinho do todo, pelo menos, o que já seria muito). Vemos a realidade a partir da política e das desgraças (que se entrecruzam demasiadas vezes), que nos chega através da (des)informação e do seu excesso e do seu excesso em imagens…
E ficamos presos nessa realidade fortemente ideologizada, tremendamente enviesada, largamente direccionada, estupidificadamente recepcionada, amplamente idealizada; quase sempre descontextualizada. E o balanço enferma a priori: Vila Mendo a acabar; a Guarda a morrer; o país na decadência; o mundo no abismo; a Transcendência, por vezes… E quase tudo (e isso também) pode ter um pouco de verdade, mas também possui um pouco (muito) de inverdade… E a posteriori, voltamos ao mesmo porque o balanço… é um contínuo balanço. De momentos. De instantes. De fuga.
Se calhar, devíamos deixar de fazer os balanços (deixá-los para as economias e para as contas- certas) e fazer verdadeiras reflexões: profundas, demoradas; no silêncio e a partir do silêncio de nós mesmos; para depois termos a pretensão e o arrojo de ler os demais, as demais coisas e a Coisa-mundo como tal.
É só uma ideia- meia abalançada!.. Já agora, balancemo-nos para um ano bom.

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