Joaquim Martins Igreja nasceu a 5 de janeiro de 1958 na Castanheira, concelho da Guarda. Fez a escola primária nesta aldeia com a severa professora Amélia Simões. Depois foi para o Seminário do Fundão onde esteve até aos 15 anos, tendo passado ao Seminário da Guarda. Neste só esteve um ano e picos porque se deu na altura o 25 de abril de 1974 e em dezembro deste ano o rapaz sentiu vontade de gozar a sua liberdade. Acabou o ano escolar (atual 11º) como externo no Colégio de S. José e depois candidatou-se a exames na Escola Sec. Afonso de Albuquerque. O ano seguinte não estava nos planos: foi o ano do Serviço Cívico Estudantil, um hiato nos estudos, a fazer inquéritos de terra em terra e a prestar alguns erviços na Cruz Vermelha. Em 1976/77 começou a frequentar a Faculdade de Letras e em 1981 concluiu o curso de Filologia Românica. Vivia-se uma altura de crescimento do sistema de ensino e começou logo a trabalhar após o 3º ano do curso (1979). Passou pelas escolas Afonso Domingues e Pedro Nunes (Lisboa) e Frei Heitor Pinto (Covilhã), onde fez estágio. Logo a seguir (setembro de 1984) voltou à Guarda e já não voltou a sair de cá.
Para além da atividade de professor do ensino secundário, teve ainda passagens breves por outras instituições de ensino, como o ISACE (Instituto Sup. Administração, Comunicação e Empresa) na Guarda e o IEFP-Guarda. Durante 15 anos (1997-2012) desempenhou o cargo de coordenador cultural da Delegação da Guarda do INATEL (depois Agência da Fund. INATEL).
Desde 1992 mantém na Escola Secundária Afonso de Albuquerque o jornal EXPRESSÃO primeiro, depois a partir de 2013 o Blogue EXPRESSÃO, destinados a difundir a imagem da escola onde trabalha e dar formação de escrita jornalística aos jovens alunos. Tem também mantido uma colaboração regular na imprensa regional, primeiro na Rádio F, depois no jornal Terras da Beira, atualmente no jornal O INTERIOR. Durante a sua permanência na Fund. INATEL, lançou e manteve durante cerca de 12 anos o Boletim Cultural do INATEL.
Atualmente na Escola Sec. Afonso de Albuquerque, para além da atividade letiva, coordena o Blogue EXPRESSÃO e é professor bibliotecário.
É casado e pai de dois filhos e nos tempos livres, para além da leitura e da corrida ou da caminhada, gosta de se ligar às atividades culturais (música, teatro, cinema, exposições), apreciando de maneira geral a programação das instituições da Guarda. Gosta imenso de viajar e, para além de gostar de ir a banhos uma semana por ano, vai dando umas fugidas ao estrangeiro quando é possível.
Infelizmente, o Professor Joaquim Igreja não conhece muito bem Vila Mendo (uma falha imperdoável, diga-se de passagem!), mas ainda vai a tempo de se redimir desta lacuna na sua caminhada existencial! Dar-lhe-emos motivos para lá ir mais amiúde!
Como professor, como avalia a Educação numa perspectiva de futuro?
A educação é um processo em que todos estamos simultaneamente a mudar. Dentro do sistema educativo já todos pensámos de maneira diferente da posição que hoje adotamos. A velocidade a que a sociedade caminha, com transformações que não imaginaríamos há poucos anos, faz que o sistema educativo se adapte, corrija o caminho, volte às vezes atrás, sem nunca sentir que se atingiu o ponto ideal. Parados, estamos a andar.
Quanto aos atores da educação, devemos estar sempre abertos à mudança: os conhecimentos evoluem, as tecnologias de comunicação também, sendo evidente o condicionamento dos jovens atuais pela tecnologia. No entanto o essencial mantém-se, com a necessidade de uma presença mediadora entre o saber e o aprendiz. A máquina não ensina sozinha.
A Educação não perdeu razão de ser apesar da disponibilização de tanta informação na Internet. Ensinar os jovens não é apenas coadjuvá-los, é também conseguir que eles parem e nos ouçam. A Escola, para além de ter de se modernizar ao nível tecnológico e dos edifícios, de ter que encontrar fórmulas que liguem a autonomia pelas máquinas e o rigor no uso da linguagem, terá que canalizar a imensa energia juvenil tantas vezes desperdiçada pelo laxismo das estruturas. Sendo a gestão do tempo uma das variantes essenciais, haverá sempre este ou aquele grupo que ouviremos carpir mágoas por esta ou aquela mudança. Mas se a sociedade muda, como pode a Escola parar? É a altura de a escola atual se lançar a novos desafios.
Que diferenças (boas e menos boas) encontra no funcionamento da Escola ao longo da sua carreira?
Os alunos eram há uns anos atrás mais dóceis, disponíveis e construtores das suas capacidades. Hoje parece que as tecnologias, o conforto e o consumo anestesiaram os jovens e lhes tiraram a vontade de aprender e de se formar. Não me parece que a escola, a família e a sociedade atual estejam a “fabricar” cidadãos responsáveis e capazes. Parece tudo envolvido numa névoa de cultura light, de “tudo já feito” e de “não me tornem as coisas difíceis”. Pedir tempo aos jovens hoje para qualquer projeto enriquecedor das suas capacidades é “roubar-lhes tempo” para os seus gadgets, a sua loucura de jogar e de comunicar a níveis estratosféricos. Os jovens, mesmo crescidos, não param de brincar e de exigir estímulos agradáveis.
Para além da desculpabilização que o próprio sistema fomenta, também os adultos se deixaram apanhar. Os pais desculpam os filhos e não sentem autoridade para os encaminhar; os professores hesitam, punem a medo, perdoam a seguir, sabendo que o comportamento se vai repetir. A Escola não terá que ser necessariamente mais castigadora mas impõe-se levar o sistema a sério e impor regras mesmo que à própria escola lhe custe aplicá-las. Creio que sem disciplina e concentração não se aprende. E esta sociedade é a sociedade do barulho.
Ensinar, é hoje mais difícil?
Pela resposta anterior, pode depreender-se que hoje educar e promover comportamentos corretos é muito mais difícil, perante uma sociedade que faz tábua rasa dos valores em nome do sucesso pessoal e uma família que não se sente capaz de pedir o outro lado do conforto que dá.
Na escola, o que sinto mais difícil é que os jovens levem a sério uma instituição que começa a ficar distante do nível da perfeição a que chegaram as fontes de lazer dos jovens. A tecnologia ultrapassou a escola e esta, por mais que tente, não chega lá, com meios reduzidos e massa humana envelhecida. A escola aparece sempre como uma força conservadora, em que o avanço tecnológico emperra, em que o ensino continua tradicional, em que aprender não consegue ser sempre agradável como um jogo de computador ou um “reality show”, em que é difícil convencer de que “aquilo” é importante. Nem que fizéssemos o pino.
Mas não vale a pena ser muito catastrofista. O sistema, como referimos acima, há de sobreviver e regenerar-se.
Coordena o jornal e blogue “Expressão” na Escola Afonso de Albuquerque; como avalia a importância desses e doutros meios de expressão/comunicação no agrupamento e respectiva comunidade educativa?
O Blogue EXPRESSÃO, que existe desde 2013, é sucessor do jornal EXPRESSÃO em papel, editado de 1992 até 2012. Sempre pretendeu mostrar a escola como uma realidade viva e atuante, como um lugar em que acontecem coisas importantes todos os dias e portanto noticiáveis. Quis também ser sempre uma escola de boa escrita para os alunos que se envolveram no projeto. Hoje é mais difícil conseguir jovens que se ofereçam para recolher informação, fazer um vídeo de um evento ou manter uma coluna fixa. É muito difícil fazer cumprir prazos quando a atualidade se vive no dia a dia e é preciso fazer a notícia nas horas seguintes ou anteriores ao evento.
O Blogue EXPRESSÃO tem um número de visualizações muito significativo, uma média de 180 por cada notícia, muito graças ao auxílio da rede Facebook que espalha as notícias e promove o Blogue. Sentimos que chegamos aos professores, a uma fração dos alunos, à comunidade em geral. Mas, dentro dos atores educativos, temos a convicção de que os pais são a fatia que mais falta conquistar.
O Blogue EXPRESSÃO, no entanto, tem a ambição de ser influente, de fazer chegar em linguagem simples aquilo que na educação muito vezes é difícil de digerir, de ser uma plataforma formativa. Queremos ser um órgão que mostre aos professores, aos pais, aos alunos, o lado escondido da escola em relação ao qual andam frequentemente “distraídos”. Queremos pô-los a pensar. Queremos fazê-los participar.
Foi coordenador cultural da Agência da Fundação INATEL da Guarda. O que mais o marcou no exercício desse cargo? Que condicionalismos o afetaram mais?
Fui coordenador cultural da Fund. INATEL na Agência da Guarda, um cargo que desempenhei com gosto entre 1 de setembro de 1997 e 31 de dezembro de 2012, durante 15 anos, portanto. O cargo tinha as suas limitações tanto em termos orçamentais (verbas reduzidas) como também operacionais (o coordenador trabalhava nesta área sozinho na Agência e a tempo parcial). A própria organização da Fundação INATEL, reportando nós à direção da Agência da Guarda mas também prestando contas e recebendo orientações dos departamentos da Fundação, tornava difícil a atividade.
No entanto confesso que foi muito agradável o trabalho de apoio às associações filiadas, nomeadamente na proximidade com os grupos de folclore, bandas filarmónicas, grupos corais e grupos de teatro amador; no esforço de criar laços interassociativos e de promover a digressão de grupos pelo distrito; na atitude formativa constante com iniciativas diversas; na construção, sobretudo para os seniores, de itinerários culturais regulares em forma de passeios culturais; na promoção da comunicação, da informação e da formação através do Boletim Cultural do INATEL-Guarda. É num cargo como este que se fica a conhecer bem o tecido associativo distrital, as suas fraquezas e as suas potencialidades.
Mantém algum contacto com o mundo rural, nomeadamente com a Castanheira, terra natal. Como vê o futuro das comunidades rurais em particular e do interior em geral?
Com a Castanheira mantenho um contacto regular, embora desde a morte dos meus pais as visitas sejam mais espaçadas, já que não tenho casa instalada na aldeia. Mas interesso-me por aquilo que sinto ainda ser meu, a presença dos meus pais, a alma daquela aldeia, o espírito que ali vive. Custa-me evidentemente ver a rua dos meus pais quase deserta. Custa-me ver os campos ao abandono, inclusive os que me calharam. Custa-me ver que os velhos não têm jovens e gente adulta com quem ficar e estão condenados ao Lar da 3ª Idade.
Tenho pena de o dizer mas não vejo grande futuro para a maior parte das comunidades rurais. Não se veem iniciativas que sejam suporte de desenvolvimento económico e sem este as aldeias não vão crescer, antes minguar. Por outro lado, os investimentos, escassos que são, tenderão a ir para as cidades médias e grandes, não para as pequenas localidades, que continuarão a ser pouco atrativas. A tentação será sempre emigrar, para perto ou para longe. Há nichos de potencial desenvolvimento, mas curiosamente poucos lhes pegam com convicção, por exemplo a criação de gado, os têxteis manufacturados e os enchidos.
Vila Mendo, diz-lhe algo?
Confesso que só lá estive por ocasiões de funerais. Passa-se em Vila Fernando e só se houver uma razão forte é que se vira para Vila Mendo. Espero ter proximamente boas razões para ir a Vila Mendo.
2 comentários:
Até que enfim que alguém diz algo realista a respeito das aldeias do interior, não tem futuro, ponto.
Boa análise. Na educação tem de haver disciplina, mas a escola também tem de saber acompanhar os novos tempos. Sem empregos as aldeias morrerão.
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