sexta-feira, 3 de julho de 2020

Memórias Paroquiais

Graça Sousa- professora

A freguesia de Vila Fernando nas Memórias Paroquiais de 1758Parte 4
1ª página
“Um aviso de 18 de Janeiro de 1758 do Secretário de Estado dos Negócios do Reino, Sebastião José de Carvalho e Melo, fazia remeter, através dos principais prelados, e para todos os párocos do reino, os interrogatórios sobre as paróquias e povoações pedindo as suas descrições geográficas, demográficas, históricas, económicas e administrativas, para além da questão dos estragos provocados pelo terramoto de 1 de Novembro de 1755. As respostas deveriam ser remetidas à Secretaria de Estado dos Negócios do Reino.” 
(Arquivo Nacional da Torre do Tombo – https://digitarq.arquivos.pt/)

As questões enviadas aos párocos de todo o país dividiam-se em três temas: a terra, a serra e o rio. 
Eis aqui algumas dessas questões e as respostas escritas pelo Pe. Policarpo da Cruz, nessa altura Vigário da freguesia de Vila Fernando. (Para facilitar a compreensão do texto, usou-se, por vezes, uma versão mais recente de algumas palavras.)

III- O que se procura saber do rio dessa terra é o seguinte… (Seguem-se 20 questões. O Vigário juntou as respostas num único texto.)
Corre ao pé deste lugar de Vila Fernando, uma ribeira que tem aqui até entrar no Rio Coa por nome Noeime. Nasce esta e tem seu princípio das águas da cidade da Guarda, de todas as suas fontes e das águas de seus arrabaldes e quintas pela parte do norte e quantas águas na dita cidade e seus arrabaldes chovem todas vêm passar pela ponte deste lugar. Saindo da dita cidade e seus arrabaldes, vem correndo amenamente sem estrépito, e até coisa de meia légua, está logo uma ponte de cantaria muito boa a que chamam do Roidis*, aonde há já moinhos e vem correndo até uma légua aonde está o lugar da Gata, freguesia de Casal Cinza, e se chama aqui Agata. Aqui tem umas poldras de pedras por onde se passa. Tornemos à cidade da Guarda, à parte do sul, as águas de duas fontes que chamam o Chafariz de S. André e a Fonte de Moura...? e as mais águas da parte do sul dos seus arrabaldes, e as águas que vêm do lugar de Porcas, que dista uma légua da cidade; juntas estas águas vai cor­rendo amenamente, sem estrépito, e já moendo moinhos com a água deste ribeiro. À coisa de meia légua está uma ponte pequena de pau, e logo abaixo está uma quinta chamada Noeime, e daqui tomou este nome daqui para baixo, e daí, coisa de meia légua, tem uma ponte de cantaria muito boa, e daqui vai correndo até se jun­tar com a outra parte que vem da parte do norte da mesma cidade a que chamam Agata, como acima vai escrito, e neste sítio, antes de se ajuntarem, está um pontão de pau a que chamam o Mouratão, por estar aqui uma quinta do mesmo nome, e juntos eles vêm cor­rendo com brandura até se meterem no Coa por ser tudo terra di­reita, e por este curso tem muitos moinhos, e chegando perto do lugar do Carapito tem um pontão de pau, e mais abaixo, junto de Vila Gracia, tem outra ponte de pau, e continuando com moinhos e chegando a este lugar que dista dele um tiro de pedrada, tem uma ponte com jazentes de pau e coberta de pedras, e tem de compri­mento 75 passos que eu medi, e terá o que toma e ocupa a água nos enchentes mais de 200 passos, e esta tem seis olhais, e muitas vezes cobre a água a maior parte da ponte; e continuando os moi­nhos daqui para baixo que são muitos, mas no Verão secam estas águas e não moem, e as suas águas não aproveitam palmo de terra que reguem, e nas tempestades passadas deu muitas perdas às terras que levou e inundou com areias, e daqui três léguas se vai meter no Rio Coa, com o nome de Noeime.

(A propósito da ribeira, o pároco de Vila Garcia, uma das freguesias vizinhas da de Vila Fernando, escreveu o seguinte:“Os peixes que produz são bordalos e outros mais pequenos que chamam sardas? e algumas enguias. Os arvoredos de suas margens são amieiros e salgueiros.” Diz também sobre a “ribeira chamada Noeime” que tem um curso “no tempo do Inverno e parte do ano copioso e muito arrebatado…”)

(Também os priores da Guarda fizeram referência à ribeira: “Há em distância de meia légua para o sul desta cidade e corre do poente para o nascente uma ribeira que principia perto do lugar de Porcas a que chamam de Noéme, e em distância de uma légua do nascimento tem uma ponte de pedra chamada a Ponte Pedrinha, e há na dita ribeira muitos moinhos que moem de inverno por no verão não ter água bastante, ainda que não seque, e por baixo da dita ponte junto do lugar da Gata se incorpora com a do Ruy Diz* e continua o seu curso até ao Rio Coa, e com este entra no Douro.”) 
*Rio Diz?

É esta igreja de Vila Fernando aro, termo e comarca da cidade da Guarda, que dista duas léguas para a parte do poente, muito espa­lhada, que se compõe de oito lugares como acima declaro, e tem 406 fogos, 1009 pessoas de confissão e comunhão, e 210 de confis­são somente, e todos a esta igreja matriz e paróquia se vêm a bapti­zar, receber e confessar no tempo da Quaresma. Eu, pároco dela, me chamo Policarpo da Cruz, natural da vila de Açores, arciprestado da vila de Celorico, bispado da Guarda, e nesta cidade me criei e dela vim para esta igreja há 38 anos. Tenho de idade 73 anos. Isto é o que pude descobrir.
Vila Fernando, 22 de Maio de 1758. 
O Padre Policarpo da Cruz

1 comentário:

Anónimo disse...

Excelente investigação.Serviço público sem dúvida