sexta-feira, 6 de outubro de 2017

Poesia popular- "Mariquinhas Costureira"



Andava na 3ª ou 4ª classe (não sabe precisar) e invariavelmente depois da escola passava por casa da sua bisavó Purificação Lopes para entretida e paulatinamente transcrever os versos, as quadras e os poemas; as lenga-lengas, as rezas e as estórias para um caderno que guarda religiosamente, mas de que já não encontra uma parte, embora a procure furiosamente uma e outra vez.  Recorda com uma saudade nostálgica esses momentos... recorda a ternura e a paciência com que a bisavó esperava que ela escrevesse tudo... recorda as explicações às palavras que não compreendia e que ela aturadamente explanava... Falamos da Paula Pereira que nos deixa, hoje, a Mariquinhas Costureira:



- Mariquinhas costureira
Tão bem sabe costurar,
Dá o ponto miudinho
Já me cá está a agradar
Se me fizesse uma camisa
O pano lhe ia comprar.

-  Vá comprá-lo senhor Eduardo
Eu sou nobre, ganho dinheiro,
Para a fazer ao seu gosto
Diga como a quer primeiro.

- Eu quero-a à moda de caixeiro
Bem sabe a minha oficina
Sabe que na minha loja
Que é a obra muito fina
Sabe que no lugar onde eu estou
Sou mirado por muita menina.

- Senhor Eduardo,
Ensine-me a doutrina
E a respeito de bem, não lhe dê cuidado,
O que eu sou muito careira,
Mas trabalho apurado.

- Há-de ser minha namorada
Mariquinhas já precisa
Isto foi um pé de falar
Que eu tenho lá muita camisa.

- Senhor Eduardo dá-me o riso,
Com coisa fraca não se “estrove”
O senhor Eduardo vale oiro
E eu nem sequer a cobre.

- Mariquinhas para mim é nobre
Sempre foi do meu intento
Se a Mariquinhas quisesse
Tratávamos do casamento.

- Isso não senhor Eduardo,
Isso não é para mim
Para levar á Igreja
Quer coisa igual a si.

- O que me acha de ruim
Mais valia estar calada
Decerto que andou de namoro
E de outro está escaldada.
Quando em mim vir falsidade,
Então me dará essa bofetada.
Mariquinhas dê-me um beijo
Que um beijo não é muito
Só para ver se eu vou logrando
Alguma coisa desse fruto.

- Deus me livre que eu fosse
À igreja com essa falha
Lá com respeito a beijos
Só se pedem à canalha.

- Quem me dera já casado
Que fosse amanhã ou depois
Se a Mariquinhas quisesse
Andava o carro diante dos bois.

- Isso não Senhor Eduardo,
Isso não lhe posso fazer
Temos tempo ou depois
Se nos chegarmos a receber.

3 comentários:

PAULA P.P. disse...

Adorei :)
Obrigado por aceitares minha sugestão e por me ajudares a recordar a minha querida bisavô com o pedacinho, do muito que ela me deixou.
Será sempre recordada com muita saudade.

Luís Filipe Gonçalves Soares disse...

Obrigado a ti por partilhares algo do que a Sra. Purificação te transmitiu.
Ficamos à espera de mais...

Zé Domingos disse...



E pela poesia também se conhece o viver da "nossa gente". As vivências do namoro / casamento dos nossos avós em nada se assemelha ao de hoje.

Obrigado pela partilha!